quinta-feira, 27 de abril de 2006

Aquarela do Brasil

Ary Barroso compôs Aquarela do Brasil no início de 1939, numa noite de chuva torrencial, que o obrigou a ficar em casa, contrariando seus hábitos. Antes que a chuva terminasse, ainda teve inspiração para compor outra obra prima, a valsa "Três lágrimas".

Quase vinte anos depois, ele mesmo descreveria a criação de Aquarela do Brasil, em entrevista à jornalista Marisa Lira, do Diário de Notícias: "Senti iluminar-me uma idéia: a de libertar o samba das tragédias da vida, (...) do cenário sensual já tão explorado. Fui sentindo toda a grandeza, o valor e a opulência de nossa terra. (...) Revivi, com orgulho, a tradição dos painéis nacionais e lancei os primeiros acordes, vibrantes, aliás. Foi um clangor de emoções. O ritmo original (...) cantava na minha imaginação, destacando-se do ruído da chuva, em batidas sincopadas de tamborins fantásticos. O resto veio naturalmente, música e letra de uma só vez. Grafei logo (...) o samba que produzi, batizando de ‘Aquarela do Brasil'. Senti-me outro. De dentro de minh'alma extravasara um samba que eu há muito desejara. (...) Este samba divinizava, numa apoteose sonora, esse Brasil glorioso."

Exageros à parte, "Aquarela do Brasil" é mais ou menos isso que Ary Barroso pretendeu fazer: uma declaração de amor ao Brasil, através de uma bela composição. É também a obra mais representativa da grande fase de sua carreira (1938-1943), em que ele completa um processo de refinamento de seu repertório, incorporando-lhe requintes até então inusitados em nossa música popular. E como foi preferencialmente um compositor de samba, é neste gênero que melhor empregará esses requintes, de forma especial nos chamados sambas-exaltação, um novo tipo de música do qual é inventor e "Aquarela do Brasil", o paradigma. Já mostra no que o gênero ofereceria em qualidades e defeitos, esta composição sintetiza suas características fundamentais: os versos enaltecedores de nosso povo, sas paisagens, tradições e riquezas naturais, a melodia forte, sincopada, sonoridades brilhantes tudo isso mostrado num crescendo, do prólogo ao final apoteótico, que procura transmitir uma visão romântica e ufanista.

"Aquarela do Brasil" foi lançada por Araci Cortes em 10.06.39, na revista Entra na Faixa, de Ary e Luís Iglesias. Inadequada à voz da cantora, não fez sucesso. Um mês e meio depois, voltou a ser apresentada, desta vez de forma destacada, pelo barítono Cândido Botelho no espetáculo "Joujoux e Balangandãs". Sua primeira gravação aconteceria em seguida (18.08) por Francisco Alves, acompanhado por orquestra que executava um arranjo de Radamés Gnattali, grandiloqüente como exigia a composição. Com esta gravação iniciava-se sua monumental discografia que incluiria figuras como Sílvio Caldas, Antônio Carlos Jobim, Radamés Gnattali, Elis Regina, Gal Costa, João Gilberto, Caetano Veloso, o próprio Ary Barroso, as orquestras de Xavier Cugat, Morton Gould, Ray Conniff, Tommy e Jimmy Dorsey e os superastros Bing Crosby e Frank Sinatra.

A carreira internacional de "Aquarela do Brasil" começou por Hollywood em 1943, quando Walt Disney a incluiu no filme "Alô Amigos" ("Saludo Amigos"), com o título de "Brazil" e versos em inglês de S. K. Russell. No mesmo ano, gravada por Xavier Cugat, fez grande sucesso nos Estados Unidos, aonde chegou a ultrapassar a marca de um milhão de execuções. A partir de então, popular no Brasil e no exterior, se consagraria como uma espécie de segundo hino de nossa nacionalidade. Longe de prever todas essas glórias, Ary Barroso inscreveu "Aquarela do Brasil" no concurso de sambas para o carnaval de 1940, vencido por "Ò seu Oscar" (1°), "Despedida de Mangueira" (2°) e "Cai, cai" (3°). Considerando-se injustiçado, Ary rompeu com Villa-Lobos, presidente da comissão julgadora, com quem só se reconciliaria em 1955.

Aquarela do Brasil (samba, 1939) - Ary Barroso - Intérpretes: Francisco Alves e outros

Título da música: Aquarela do Brasil (I) / Ary Barroso (Compositor) / Francisco Alves (Intérprete) / Radamés e Sua Orquestra (Acomp.) / Disco Odeon 11768-a / Nº da matriz: 6179 / Gravação: 18/08/1939 / Lançamento: 10/1939 / Gênero musical: Cena Brasileira / Coleções de origem: Nirez, José Ramos Tinhorão, Humberto Franceschi, IMS D



Título da música: Aquarela do Brasil (II) / Ary Barroso (Compositor) / Francisco Alves (Intérprete) / Radamés e Sua Orquestra (Acomp.) / Disco Odeon 11768-b / Nº da matriz: 6180 / Gravação: 18/08/1939 / Lançamento: 10/1939 / Gênero musical: Cena Brasileira / Coleções de origem: Nirez, José Ramos Tinhorão, Humberto Franceschi, IMS D



Título da música: Aquarela do Brasil / Ary Barroso (Compositor) / Sílvio Caldas (Intérprete) / Orquestra (Acomp.) / Disco Victor / Gravação: 29/05/1942 / Lançamento: 08/1942 / Nº do Álbum: 34949 / Nº da Matriz: S-052542 / Gênero: Samba

G6(9)
Brasil!
                
Meu Brasil brasileiro
               G6(9)
Meu mulato inzoneiro
                       F7    E7
Vou cantar-te nos meus ver...sos
Am7          D7(9)     Am7
   O Brasil, samba que dá
           D7(9)      Am7
Bamboleio, que faz gingar
          D7(9)   Am7
Ó Brasil, do meu amor
         D7(9)   G    Em7
Terra de Nosso Senhor
   Am7  D7(9) G    Em7
Brasil!    Brasil!
    Am7  D7(9)  G    G5+   G6   G5+
Pra mim,    pra mim
G  G5+  G6           G5+        Am   Am5+  Am6
Ó          abre a cortina do passado
           Am5+        Am   Am5+  Am6
Tira a mãe preta do serrado
           Am5+        G    G5+  G6
Bota o rei congo no congado
    Am  Am5+  Am6
Brasil!
    G   G7  F#7  F7
Brasil!
 E    F  E           F           E   F  E
Deixa      cantar de novo o trovador
       F            E   F  E
A merencória luz da lua
        E7          Am   Am5+  Am6  Am5+
Toda canção do meu amor
Am    Am5+  Am6          Am7(b5)  Bm7
Quero           ver a Sá Dona caminhando
G          Em7       A7
   Pelos salões arrastando
Am7         D7(9)   G    Em7
   O seu vestido rendado
   Am7  D7(9) G    Em7
Brasil!    Brasil!
    Am7  D7(9)  G    G5+   G6   G5+
Pra mim,    pra mim
   G6(9)
Brasil!
               
Terra boa e gostosa
             G6(9)
Da morena sestrosa
               F7    E7
De olhar indiferen...te
Am7          D7(9)     Am7
   O Brasil, samba que dá
           D7(9)      Am7
Bamboleio, que faz gingar
          D7(9)   Am7
Ó Brasil, do meu amor
         D7(9)   G    Em7
Terra de Nosso Senhor
   Am7  D7(9) G    Em7
Brasil!    Brasil!
    Am7  D7(9)  G    G5+   G6   G5+
Pra mim,    pra mim
G  G5+  G6       G5+           Am   Am5+  Am6
O         esse coqueiro que dá côco
          Am5+          Am   Am5+  Am6
Oi, onde amarro a minha rede
           Am5+        G   G5+  G6
Nas noites claras de luar
    Am  Am5+  Am6
Brasil!
    G   G7  F#7  F7
Brasil!
E  F  E       F           E      F  E
Oi      estas fontes murmurantes
           F            E    F  E
Oi onde eu mato a minha sede
         E7          Am   Am5+  Am6  Am5+
E onde a lua vem brincar
Am  Am5+  Am6         Am7(b5)        Bm7
O,            esse Brasil lindo e trigueiro
G             Em7      A7
   É o meu Brasil brasileiro
Am7         D7(9)      G    Em7
   Terra de samba e pandeiro
   Am7  D7(9) G    Em7
Brasil!    Brasil!
    Am7  D7(9)  G    G5+   G6   G5+
Pra mim,    pra mim


Fontes: A Canção no Tempo - Vol. 1 - Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello - Editora 34; Discografia Brasileira - IMS; Instituto Moreira Salles.

4 comentários:

  1. HÁ UM ERRO NA LETRA ACIMA: não é "Quero ver ESSA dona caminhando...". O correto é "Quero ver a SÁ DONA caminhando...", tal como está na partitura original da composição. "Sá dona" é corruptela de "Senhora Dona" (variantes; "siá dona" e "sinhá dona"). Refere-se à esposa do fazendeiro ou do senhor de engenho, a dona da Casa Grande, tal como era designada pelos escravos e peões. Lembremos que o compositor está "abrindo a cortina do passado".

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    1. Correto! Acessei o site oficial de Ary Barroso e já corrigi para "...a Sá Dona caminhando". Obrigado pelo comentário!

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  2. Uma pena não ter mostrado as outras versões (a de Francisco Alves por exemplo)

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  3. divino ... devia estar iluminado de talento

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