quarta-feira, 12 de abril de 2006

A Jovem Guarda


Num sentido estrito, a expressão "Jovem Guarda" designou um programa da TV Record, de São Paulo SP, estreado em setembro de 1965 e findo em 1969, comandado por Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléia; mas tem sido comumente empregada para definir gênero musical também conhecido como iê-iê-iê, seja, a versão brasileira do rock internacional.


A Jovem Guarda foi, entretanto, cristalização de uma tendência bem anterior: a informação do rock’n’roll norte-americano da década de 1950 já criara no Brasil um mercado de consumidores e aficionados, permitindo que, desde 1957, os primeiros cantores e compositores brasileiros do gênero tentassem reproduzir o ritmo com letras em português ou cantando no original.

Entre os maiores expoentes desse período estavam os irmãos Tony e Celly Campello, Sérgio Murilo, Ed Wilson e, em fase pouco posterior, Ronnie Cord e os grupos The Jordans, The Jet Blacks e The Clevers. O trio central — Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderleia entrou em cena justamente quando começava a se acentuar a queda de popularidade dos primeiros artistas brasileiros do rock’n’roll.

Em 1961, Celly Campelo decidiu afastar-se da vida artística, enquanto as atenções se voltavam para a bossa nova e, nos meios de comunicação, sobreviviam poucos espaços: o programa Hoje é Dia de Rock, de Jair de Taumaturgo, na Rádio Mayrink Veiga carioca; o Clube do Rock, de Carlos Imperial, na TV-Rio, e Crush em Hi-Fi, na TV Record, de São Paulo.

Em discos, os sucessos rareavam: Marcianita, com Sérgio Murilo, Diana, com Carlos Gonzaga. Roberto Carlos optou, então, por algum tempo, pela bossa nova, mas Erasmo Carlos e Wanderléia decidiram insistir, tentando divulgar um tipo de música que, nessa época, já tinha muito de bolero e samba-canção, misturado ao ritmo do rock’n’roll. No Rio de Janeiro RJ, Ed Wilson, Cleide Alves, Renato e seus Blue Caps também esperavam sua oportunidade.

Foi o repentino sucesso de um compositor e intérprete radicado em São Paulo que abriu a brecha para o que seria a Jovem Guarda: em 1963, Ronnie Cord conseguiu bons índices de venda e popularidade com o rock Rua Augusta (de Hervé Cordovil), chamando a atenção do público e dos homens de media para as figuras de Roberto Carlos e Erasmo Carlos, principalmente, autores de Parei na contramão. Em seguida, É proibido fumar e Festa de arromba (da mesma dupla) confirmaram a existência do mercado.

Foi dessa música — onde os dois celebram textualmente seus companheiros de vida artística e preferência musical — que surgiu a idéia de um programa de televisão, concretizado pela TV Record paulista, na época grande investidora em música popular. Inicialmente o programa deveria chamar-se Festa de Arromba e ocuparia uma hora ociosa, a tarde de domingo, vaga desde a proibição de transmissão dos jogos de futebol. Com o nome definitivo de Jovem Guarda, o programa foi ao ar pela primeira vez em setembro de 1965, reunindo Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléia, os cantores Eduardo Araújo, Sérgio Murilo, Agnaldo Rayol, Reynaldo Rayol, Martinha, Cleide Alves, Meyre Pavão, Rosemary e os grupos The Jordans, The Jet Blacks, Renato e seus Blue Caps, Os Incríveis e Golden Boys.

Rapidamente, a Jovem Guarda tornou-se uma das grandes atrações da emissora, reunindo grandes plateias de adolescentes no Teatro Record, mas foi a partir de 1966, com o grande sucesso de Roberto Carlos e Erasmo Carlos Quero que vá tudo para o inferno, que o programa tomou proporções nacionais e passou a ser sinônimo de movimento ou tendência musical.

Outros artistas se juntaram ao grupo inicial: Ronnie Von, Vanusa, De Kalafe, Deny e Dino, Leno e Lílian, Antônio Marcos, Os Vips, Os Brasões, The Pops, entre outros. Seguindo o exemplo da Apple, promotora dos Beatles, a agência de publicidade Magaldi, Maia & Prosperi passou a coordenar industrialmente a imagem do trio central da Jovem Guarda, criando as marcas Calhambeque, Tremendão e Ternurinha para uma série de produtos que ia de bonecas a calças e blusas.

Vários compositores de outras áreas começaram então a se interessar pelos ritmos da Jovem Guarda, como Jorge Ben, que passou a freqüentar o programa, e os baianos Gilberto Gil e Caetano Veloso, que, aconselhados pela cantora Maria Bethânia, incorporaram ao seu trabalho elementos do iê-iê-iê, como as guitarras que acompanhavam Domingo no parque e Alegria, alegria, no III FMPB, da TV Record, em 1967.

Segundo Erasmo Carlos, foi justamente a Tropicália — movimento que Gil e Caetano fundaram nesse período — uma das principais causas do esvaziamento da Jovem Guarda. “A Tropicália — diz ele — era uma Jovem Guarda com consciência das coisas, e nos deixou num branco total”.

Mas, antes de se extinguir totalmente no início de 1969, diluída pela superexposição ao consumo, pelo cansaço e esgotamento criativo de seus participantes e pelos prejuízos que levaram Magaldi, Maia & Prosperi a desistir dos esquemas comerciais, a Jovem Guarda deixou sua contribuição, alimentando vários programas semelhantes na televisão, como a Festa do Bolinha, de Jair de Taumaturgo, na TV-Rio carioca, e publicações especializadas, como a revista Reis do iê-iê-iê, sucessora do que a Revista do rock tinha sido para o rock’n’roll brasileiro na década de 1950.

Além de projetar nacionalmente alguns de seus ídolos, o movimento foi em grande parte responsável pela posterior assimilação de instrumentos eletrônicos na música brasileira de todas as tendências e pela fusão de informações estrangeiras e dados nacionais que caracterizou a produção musical na década de 1970.

No início da década seguinte, Leo Jaime, os Titãs, a Blitz e outros intérpretes e grupos roqueiros retomaram a musicalidade simples e direta da Jovem Guarda, constituindo a Nova Jovem Guarda.

Em 1995, remanescentes da Jovem Guarda se reuniram para comemorar os 30 anos do movimento, gravando uma caixa de cinco CDs para a Polygram, onde recriam os antigos sucessos, e fazendo uma serie de shows com com êxito nacional: Wanderléia, Erasmo Carlos, Ronnie Von, Bobby de Carlo, Os Vips, Os Incriveis, Martinha, Leno e Lílian, Golden Boys e outros.

Ainda em 1995, a Paradoxx lançou dois CDs com vários artistas da Jovem Guarda, mas gravados ao vivo, nos shows comemorativos; e, no ano seguinte, a revista Caras colocou no mercado uma coleção de seis CDs e fascículos, contando a historia da Jovem Guarda e com remasterizações das gravações originais.

Protagonistas


Algumas letras, ciras e gravações









Fonte: Enciclopédia da Música Brasileira - Art Editora e Publifolha, SP, 1998.

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